Quem foi São Romualdo?

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Quem foi São Romualdo?

Como acontece em relação a muitos santos da antiguidade, e até mesmo da Idade Média, não temos rico material que nos permita conhecer os fatos particulares das várias fases da vida de São Romualdo, embora tenhamos muitos testemunhos sobre a vida espiritual e as atividades dele. Sua biografia destacam a ação do Senhor na sua vida, e como, com sua própria vida serviu de modelo e fonte de evangelização para todos os que conviveram com ele. E, através desta biografia, também nos inspira em nossa caminhada espiritual. m

Sobre São Romualdo temos duas preciosas testemunhas. São Bruno Bonifácio (+1009), seu discípulo direto, e São Pedro Damião (+1072) que recolheu testemunhos dea viva voz dos discípulos. O primeiro narra sua experiência pessoal na “Vida dos 5 Irmãos” , enquanto o segundo escreve a “Vida de São Romualdo”.

 

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São Romualdo nasceu em uma família nobre na cidade de Ravenna (Itália Centro Norte) por volta do ano 952. Aos 20 anos, ao fim de um doloroso processo de conversão interior, tomou a decisão de tornar-se monge na abadia beneditina de Santo Apolinário em Classe na cidade de Ravenna, que seguia a tradição da grande Cluny(França).

 

Querendo seguir com coerência a vocação a “nada antepor ao amor de Cristo”, como tinha apreendido com a Regra de São Bento recém professada, e tendo a permissão do abade deixou cedo o mosteiro em busca de condições mais favoráveis para atuar em sua profissão monástica.

Através do monge Marino, que vivia na solidão e na penitência eremítica, São Romualdo descobriu gradualmente, ao longo de três anos, sua verdadeira vocação para dedicar-se totalmente a Cristo, na escuta da sua Palavra, na purificação do coração, na obediência ao Espírito que guiava sua consciência. Descobriu, ao mesmo tempo, que a solidão não o afastava dos irmãos, da vida da igreja e dos pobres, mas pelo contrário o enraizava em uma comunhão solidária mais profunda com eles.

Colocando-se com humildade em comunhão com a Igreja, São Romualdo viveu como discípulo na tradição monástica do Oriente (os padres do deserto) e do Ocidente (São Bento). Sua primeira escola foi Santo Apolinário em Ravenna (anos 972 – 975) e mais tarde o mosteiro de Cuxá (montanhas dos Pireneus na Espanha, anos 997 -998), e a abadia mãe do monaquismo beneditino, Monte Cassino (ano 1000). Seguindo o ensino da Regra, faz do amor ao Senhor e entre os irmãos o seu norte supremo de vida (RB 4,21 e 72,11), solidarizou-se com as dificuldades da vida da igreja e da vida monástica do seu tempo e abraçou os desafios pela sua renovação. Os discípulos chamaram este seu ensino de “relacionar-se segundo a lei suprema do amor fraterno” (privilégium amoris”).

São Romualdo ansiara de todo coração à intimidade com Cristo na contemplação, alimentada pela meditação fiel da palavra, pela oração contínua dos salmos, pela eucaristia e por uma vida ascética de purificação interior e, ao mesmo tempo, empenhara-se na reforma espiritual da vida dos sacerdotes, dos monges e dos leigos, alternando vida solitária no eremitério e peregrinação incansável pelas estradas do mundo.

São Romualdo não teve nenhuma pretensão de tornar-se, e ser considerado, “fundador” de uma “nova vida monástica”, enquanto ficava profundamente enraizado na santa tradição. Mas irradiava espontaneamente a fecundidade e a sabedoria de vida que o Espírito do Senhor alimentava nele e que o guiava para atualizar no seu tempo a herança dos padres do monaquismo. Este impulso profético e a criatividade para traduzir de maneira atual a antiga herança monástica conferia a São Romualdo e a seu estilo de vida a força da novidade.

O próprio Espírito tornou São Romualdo “pai” e “mestre”, suscitando ao seu redor discípulos e discípulas. Reformou mosteiros existentes, fundou novos mosteiros e eremitérios, preferindo entregar a condução prática deles aos discípulos mais maduros e cuidar ele mesmo dos discípulos, guiado pela preciosa virtude espiritual e humana da “descrição” (discrição?). Nada de excesso ou de extravagante na vida espiritual e no estilo de vida quer na solidão do eremitério quer na vida comunitária do mosteiro: a Regra, a experiência e os ensinos dos padres, constituem o guia sempre válido para caminhar na via da perfeição.

Aos eremitas do seu tempo, que viviam sem regra de vida experimentada nem vínculo de obediência, oferece o modelo do eremitério onde a base da vida permanece na Regra de São Bento e na obediência ao prior, enquanto aos monges dos grandes mosteiros onerados de tantos pesadelos organizativos oferece a simplicidade da pequena comunidade do eremitério. O eremitério de São Romualdo se apresenta como o herdeiro no ocidente da antiga forma da “lavra” do monaquismo do oriente médio, quase uma pequena aldeia de monges animada por um pai espiritual, e que tem no edifício da igreja o centro espiritual e estrutural das habitações dos monges (celas). 

Pelo Espírito Santo São Romualdo recebeu a graça de uma profunda experiência mística na fiel oração cotidiana dos salmos e da missa, sendo introduzido pelo mesmo Espírito ao silêncio da união interior com Deus e à inteligência espiritual das escrituras. (VR c, 31 e 50). A chamada “pequena regra de ouro” deixada por São Romualdo ao discípulo João, resume de maneira maravilhosa a pedagogia da oração aprendida por São Romualdo da tradição e fica espelho fiel da sua pessoal experiência .No ano 1000, São Romualdo aceita o pedido de alguns dos discípulos e do imperador Oto III, de enviar alguns deles para a missão de evangelização na Polônia, para evangelizar os pagãos com o exemplo da comunidade monástica e com a pregação. Eles querem enfrentar esta missão por amor a Cristo, conscientes que tal escolha poderia comportar também o martírio. É o desejo do martírio junto com Cristo e para Cristo que mais os empurra a esta aventura, seguindo o exemplo dos apóstolos e dos monges britânicos e alemães que tinham evangelizado a Europa entre os séculos VII-IX.

Em 1003 os discípulos Bento e João e os três primeiros noviços poloneses morrem mártires, e no ano 1006 também o discípulo Bruno Bonifácio encontra a mesma graça do martírio dos seus amigos e companheiros no discipulado de Romualdo e na evangelização. No ano 1010 o próprio São Romualdo, ao aprender com a morte dos discípulos, determina partir ele mesmo junto com outros discípulos pela missão para a Hungria. Depois de uma longa viagem até os confins daquela nação, cai repetidas vezes doente, entende a mensagem da divina providência e volta para Itália. Mas, anota São Pedro Damião, “embora não tenha sido morto por mãos dos perseguidores, não foi privado da palma dos mártires, ele que sempre foi inflamado pelo fogo do amor a Cristo”.

Em 1027 São Romualdo funda o Sagrado eremitério de Camaldoli, na diocese de Arezzo em comunhão com o então bispo Tedaldo. Será sua última fundação, na qual entrega aos poucos discípulos a síntese do seu exemplo e de seu ensino: “permanecer na cela, jejuar e rezar”.

O prior Rodolfo, destaca assim a exigência de que os exercícios ascéticos do silêncio, do jejum e da oração sejam expressão de autêntica atividade interior: “A meditação silenciosa acontece quando se unem indissoluvelmente a regra do calar e a viva ocupação do meditar. Uma sem outra não basta para a nossa salvação. Em verdade o silêncio sem meditação é morte, sepultura de um homem ainda vivo. A meditação sem o silêncio é ineficaz, inútil. É como um homem agitando-se fechado em uma sepultura… Para que serve permanecer com a língua calada, se a vida ou a consciência estão em tempestade?” (Rodulfo II, – ano 1180 – “Consuetudo Camaldulensis- LER”, 1-3; 9).

Para alcançar o objetivo de um autêntico amadurecimento humano e espiritual e viver as ricas potencialidades da vida no eremitério, outro prior Rodolfo, quarto sucessor de São Romualdo, deu plena estrutura de mosteiro à hospedaria de Fonte Bom, dois quilômetros abaixo do eremitério, para formar os candidatos à vida eremítica. Assim Camáldoli, com a comunidade formada por vida cenobítica e vida eremítica, torna-se o modelo de uma tradição espiritual herdada de São Romualdo e que permanece ao longo de dez séculos até hoje.

“Quem era São Romualdo, precisamente? Um monge, um eremita, um pregador, um reformador, um missionário, um profeta? Tudo isso de uma vez. Romualdo não é absolutamente classificável, bem como também os mais típicos dos padres do deserto, mestres dele, seus amigos e modelos, dos quais ele herdou a graça específica” (P. L.A.Lassus).

Comunhão e complementariedade entre vida comum no mosteiro e vida solitária no eremitério e abertura à missão em suas várias formas por amor de Cristo, constituem a preciosa herança recebida de São Romualdo e dos seus discípulos, que a milenária tradição de Camáldoli guarda até hoje.

Na nossa pequenez desejamos partilhar este tesouro do Espírito também com a Igreja e o povo do Brasil.