Proposta de Vida

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A vida cotidiana das monjas se desdobra ao redor de alguns eixos fundamentais que uma secular tradição de sabedoria espiritual tem elaborado a partir da experiência vivenciada por inúmeros homens e mulheres que dedicaram a própria vida ao Senhor e ao serviço do próximo. O estilo da vida monástica beneditina e camaldolense é marcado pela virtude da “discrição/discernimento/medida”, como destaca São Gregório Magno o grande biógrafo e intérprete de São Bento. O intento da Regra e da organização do dia é guiar a monja a construir sua vida totalmente orientada para com o Senhor, purificando seu coração e unificando nele suas energias vitais, na medida que cresce a experiência da força transformante do amor no Espírito Santo. Com isso cresce a autêntica liberdade interior e a recíproca relação na caridade.

Eis alguns dos principais elementos desta cotidiana construção da pessoa e da comunidade monástica. Eles animam o movimento interior e marcam o ritmo do dia.

– estudo e meditação perseverante da Palavra de Deus (lectio divina), em clima de silêncio, espírito de oração e humildade;

– celebração do mistério pascal de Cristo na liturgia eucarística e na das horas;

– busca da obediência de fé ao Senhor guiados pela sua Palavra, a Regra de São Bento, a tradição viva de São Romualdo e dos padres monásticos, as orientações do magistério da igreja e a reflexão teológica da comunidade cristã, o ministério de animação e de comunhão da Priora, em espírito de comunhão fraterna.

– trabalho manual e cultural, segundo as circunstâncias, executado em colaboração fraterna;

– acolhida de Cristo nos hóspedes, nos pobres e nos necessitados de qualquer forma;

O resultado de tudo isso é a criação de autêntico espírito filial nas relações com o Senhor e de sincero espírito fraternal entre os membros da comunidade que se abre ao mundo inteiro.

 

Espírito de oração filial e primado do amor

O Pai nos escolheu no Filho e nos predestinou a sermos filhos adotivos. Consagrados pelo Espírito Santo para formarmos um edifício espiritual e um sacerdócio santo, somos chamados a fazer da nossa vida um sacrifício espiritual agradável a Deus por Jesus Cristo. Sendo assim aqueles verdadeiros adoradores que o Pai procura (cf Jo 4,23), unidos nos sacramentos da igreja à oblação que o Cristo faz de si mesmo ao Pai, exercemos em plenitude o nosso caráter sacerdotal. Este culto espiritual, enquanto tem seu centro na liturgia e na vida ascética, abraça todas as expressões da vida pessoal e comunitária.

Participar a esta relação do amor filial de Jesus para com o Pai, constitui a verdadeira escola na qual a monja apreende a lei do “primado do amor”, lei suprema de toda a vida monástica, e sentido das regras e sugestões ascéticas e espirituais. O primado do amor (privilegium amoris) foi a marca que destacou a relação de São Romualdo com seus discípulos, como mestre e como pai, e a marca que mais frisou o testemunho pessoal e o ensino de Don Benedetto Calati (1914- 2000), o Prior Geral de Camaldoli que contribuiu de maneira tão profunda à renovação espiritual e organizativa da congregação camaldolense depois do concílio Vaticano II. É a herança que queremos guardar cuidadosamente para guiar o estilo da nossa presença na igreja do Brasil.

Eucaristia, Liturgia das horas, lectio divina, serviço na caridade, constituem o horizonte espiritual que alimenta o sentido filial e fraternal da vida da monja camaldolense.

 

Celebração eucarística (Junto com o Mosteiro dos Monges).

A celebração eucarística, perene presença do mistério pascal de Cristo, é o centro da vida da comunidade. Dela a igreja nasce, dela continuamente vive e por ela cresce e se desenvolve até o encontro final com Cristo, seu esposo glorioso.

Portanto as monjas vão procurando que a orientação espiritual da sua vida seja preparação e expansão da celebração da liturgia e em maneira especial da eucaristia. Cuidam que todos os membros recebam uma boa formação litúrgica e que as celebrações se desenvolvam com um estilo simples e solene ao mesmo tempo, com respiro e ritmo contemplativo que favoreça uma autêntica participação ativa interior e ritual.

Favorecer tal participação ativa das monjas, dos hóspedes e do povo é um critério fundamental da espiritualidade e da ação pastoral da nossa comunidade. Por isso a liturgia é celebrada em português, guardando ao mesmo tempo o ritmo contemplativo do antigo canto gregoriano do qual ressoam alguns dos mais significativos cantos, e oferecendo na homilia cotidiana orientações para interiorizar a palavra e o mistério celebrado.

 

Liturgia das Horas (Laudes em conjunto com o Mosteiro dos Monges)

Na liturgia das horas a igreja oferece ao Pai o sacrifício de louvor e a ação de graças pela salvação em Cristo, dando voz à inteira família humana e à mesma criação que geme na espera da plena libertação dos filhos de Deus. Como a liturgia das horas, conforme a tradição, pretende santificar o curso do dia dando respiro interior ao ritmo das obras do homem, a celebração dela é distribuída ao longo do dia com sapiente medida, alternando oração comunitária e trabalho.

 

Lectio divina e oração particular (A diária é individual e a semanal em conjunto com o Mosteiro dos Monges)

A experiência de Deus vivida na celebração litúrgica, tem a necessária preparação e a natural expansão num empenho coerente de vida e no encontro contínuo com o Pai, cultivado no silêncio do coração e no contato com a sua Palavra, “alimento da alma, manancial puro e perene da vida espiritual”, como lembra o Concilio Vaticano II (DV 21).

A tradição monástica tem considerado fundamental este encontro com a Palavra de Deus e tem feito dele a “lectio divina” por excelência. Ela abrange, em primeiro lugar a Sagrada Escritura, os padres da igreja, a tradição e a reflexão sempre viva na igreja, no intuito de conduzir a monja a uma inteligência cada vez mais profunda da Palavra divina e a uma atuação mais plena da vontade salvífica do Pai.

Da participação pessoal à liturgia e da prática da lectio divina, desabrochará na alma da monja, sob o influxo do Espírito Santo, aquela oração secreta feita em compunção e pureza do coração, recomendada por São Bento, conforme ao preceito evangélico (Mt 6,6).

Compenetrada e fomentada pelo indispensável clima de silêncio em que Deus fala, praticada com fidelidade, esta oração deve ser para a monja um elemento constante da sua vida filial, além do horário comunitário visando garantir uma medida mínima e indicando uma atitude permanente.

Permanece fundamental, para a monja camaldolense, o ensino do nosso santo pai Romualdo que entregou aos discípulos como herança preciosa, esta pérola de espiritualidade do oriente e do ocidente monástico, chamada por seu discípulo João “pequena regra de ouro”:

 

” Fica sentado na tua cela, como no paraíso. Expele da memória o mundo inteiro e joga-o atrás de ti. Fica vigilante e atento aos bons pensamentos como um bom pescador aos peixes. Única via, para ti, encontra-se nos Salmos. Não deixá-la mais. Se tu que és noviço não consegues entender tudo, ora aqui e ora lá, procura rezar os salmos com o coração e entendê-los com a mente. E quando na leitura começas a distrair-te, não desanimes deixando de meditar, mas esforça-te para voltar à atenção. Antes de tudo, coloca-te na presença de Deus com atitude humilde, como quem está na presença do imperador. Esquece-te totalmente e fica aí como uma criancinha, contente só com a graça de Deus. Pois, se a mãe não dá, ela não tem de que comer, e a comida mesma não tem sabor.”

(São Bruno Bonifácio, Vida dos cinco Irmãos, cap 19)